terça-feira, 20 de julho de 2010

o teu amanha


Queria ser novamente criança e escrever-te uma carta. Queria escreve-la e colocar nela o meu perfume, na esperança de que ao me inspirares, me levasses contigo. Davas-me a mão, partíamos para onde quer que fosse, inocentes ou felizes, talvez ambos, porque a inocência é a maior felicidade e assim tudo é mais fácil, é mais simples, mais natural. Nesses dias, bastava sentares-te à minha frente, entre as minhas pernas, e deixares-te cair no meu peito, lentamente, para eu te sussurrar os versos que tinha escrito na sala de aula, quando parecia distraído, enquanto olhavas para mim de fininho com medo que eu encontrasse o teu olhar desprevenido e tu corasses de vermelho timidez, versos que saiam ao ritmo dos teus suspiros, baixinhos, lentos, prolongados. Então ficávamos ali, suspensos sem tempo nem espaço, entre sussurros e silêncios, partilhando as batidas que marcavam o ritmo da nossa inocência, da nossa felicidade, enquanto não tínhamos perguntas nem queríamos respostas, enquanto nos bastava saber que existe um amanhã, lá ao longe…

Mas tu nunca recebes-te essa carta, talvez porque eu nunca a tenha escrito, é verdade, mas só sei que nunca me deste a mão e esses versos que ainda eu hoje sei sussurrar, já não são inocentes nem felizes, já fazem perguntas e exigem respostas e por isso, vou amarrota-los e atira-los da minha cabeça, não num teu amanhã porque ainda está lá longe, mas num meu ontem porque já se fez tarde. Vão-se os versos mas ficas tu, porque na vida guardamos melhor quem nos marca por ficar do que quem marca por partir.

Sem comentários:

Enviar um comentário